Essa semana o texto é muito pessoal. Resolvi abrir meu diário.
Leia em segredo. Escrevi essa carta ao meu pai, que já se foi.
Espero que esse amor incondicional chegue até você.
“Essa é uma carta com histórias contadas de filha para pai. Histórias nossas, de confissões, conselhos e segredos.
Meu pai não foi apenas um herói. Ele teve poderes maiores. Era o único homem capaz de se levantar todas as noites, sem ninguém ouvir, e cobrir com lençol os 4 filhos ao mesmo tempo.
Pessoa comum no dia a dia. Ia ao banco e, apesar do pouco cabelo, ao barbeiro. Durante a semana fazia mercado e cassulê do vaqueiro nos fins da semana.
Domingo era dia de missa. Católico fervoroso, seguia os ensinamentos e ensinava com sua fé. Inabalável também era o seu amor pelo palmeiras. Jogador na juventude, um dia ele me confessou que perdeu um pênalti na final do campeonato, lá em Tupã. Ainda acho que fez por querer, para mostrar que heróis também falham. Mas essa foi sua única falha.
Marido perfeito, pai exemplar, irmão dos bons, amigo fiel, avô de dar inveja até em quem era “só” filho. Foi sogro, tio e patrão. Foi homem de bem. Nas viagens de negócio nunca se esqueceu do nosso acordo maior: chocolate na bagagem. Era um beijo por cada 3, 4 chocolates. E ele trazia aos montes. Diamante negro, choquito, bis. Repetia o ritual todas as viagens. Era um homem de prestígio.
Meu pai fez da minha infância um parque de alegria. Como a gente era feliz! Tinha sorvete em dia de gripe, piscina em dia de chuva e castigo nunca tinha. Em troca pouco fazíamos. Nosso dever era buscar um cafezinho depois do almoço… E antes do cochilo diário, tirar as botas dos pés de meu pai.
Veio a nossa adolescência e com ela toda a compreensão do herói. Ele dava horário para voltar para casa e na volta sempre tínhamos o que e para quem contar.
Ensinava e depois confiava. De uma bondade extrema, sempre deu muito mais do que recebeu. O amor era depositado em dobro.
Meu pai foi um herói de humildade. Rotariano, doador de sangue, papai noel de crianças carentes… Nunca negou um prato de comida. Nem para os outros, nem para ele. Apreciava a boa mesa e agradecia o que tivesse nela. Dobradinha, mocotó, churrasco e um bom arroz com feijão. Homem de raíz forte, filho de gente boa… Fez brotar.
De olhos pequenos – porém azuis – e abraço farto, o herói tinha no lugar da barriga um travesserio para consolar. No choro, um cafuné. Mãos pesadas, jamais usadas para bater.
De broncas certeiras, meu pai só precisava olhar. A gente sabia exatamente a hora de obedecer.
Seu poder também estava nos livros. Devorava cada um e sempre tinha o que falar. Conhecia as letras e fazia bom uso das palavras. Foram tantos conselhos!
Fazendeiro por paixão e advogado por formação, sua maior defesa foi em nome da família. E assim a fez por toda a vida.
De valores rígidos e princípios severos, seu Edison- assim com “i”- era do tipo que abençoava os filhos… e se Deus quiser, sempre vai abençoar.
Bença pai.”