Há uns dias, seguindo uma tradição portuguesa da Páscoa, fui comprar um pão de ló no charmoso mercadinho aqui da rua. A ideia era ajudar o comércio local durante esses tempos difíceis.
– Quanto é, seu João???
– Se a senhora puder pagar, é …
Sim, fui ajudar e recebi, de graça, mais uma lição de solidariedade. Se não tivesse dinheiro, o seu João não cobraria. Simples assim. O “ajudado por mim” não pensou duas vezes para me oferecer ajuda.
Em tão pouco tempo, Portugal nos ensinou muito. O país onde as coisas parecem acontecer em ritmo desacelerado, agiu rapidamente para travar uma contaminação em massa. Da confirmação do primeiro caso de Covid-19 ao fechamento de tudo, foram apenas 7 dias. Veio o aviso de parar e a população obedeceu. Ao invés de discutir, os portugueses se fecharam em suas casas, regados de um bom vinho e muita fé. A sabedoria do velho mundo imperou por aqui. “Quanto antes nos isolarmos, mais rápido voltaremos às ruas”, era o que se ouvia, além do barulho do comércio fechando suas portas. De repente, tudo parou. Não há conversas nos cafés, nem croissants recheados nas vitrines das pastelarias.
Os portugueses compreenderam que o vírus não se espalha, e sim que nós espalhamos o vírus. No melhor estilo mosqueteiro de “um por todos e todos por um”, se recolheram. Portugal fechou suas fronteiras, mas se abriu aos imigrantes que aqui vivem. Em um belo ato de dignidade humana, os imigrantes ganharam o direito ao serviço único de saúde, gratuito, mesmo os que ainda não tinham a situação de residente em dia. Todos! Uma responsabilidade coletiva. Tudo em nome do pequeno país de grandes ações.
Cada cidadão, à sua maneira, decidiu colaborar. Não falta nada no mercado. Cada um compra apenas o necessário. Tem papel higiênico, farinha e vitamina C nas prateleiras. Tem também o respeito a distância, a fila de espera e nenhum tumulto. Todos sabem o que o outro está passando. Sim, os portugueses pensam no próximo… e sabem esperar. São obedientes ao ritmo da vida. Sabem que tudo tem um tempo certo para acontecer. Conhecem os limites do tempo… e que a vida não se compra. Um dos depoimentos mais intensos que vi nas últimas semanas foi o da filha do chairman do Banco Santander. Ela, herdeira de uma família milionária, viu o pai morrer precisando de algo que todos nós temos de graça: o ar. Triste, real e que nos ensina muito. Depois dessa, jamais seremos os mesmos.
O futuro? O futuro fica para depois. Portugal aprendeu com o passado destroçado por guerras e decidiu pensar no hoje. Optou por salvar o maior número de vidas possível. O país tem uma das maiores populações de idosos do mundo. E, por eles, Portugal parou. São esses idosos que em breve vão voltar a encher as pastelarias, as cafeterias, as bancas de revistas, como sempre fizeram… com tempo para uma conversa fiada, para ensinar um pouco de vida e, claro, para um golinho de café.